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sexta-feira, 20 de março de 2015

Feita de Medos


Não sou feita de medos,  sou um pouco das minhas escolhas e principalmente as consequências delas.

         Meu medo da água e do mar não encontro resposta,  é um vazio que sinto,  uma vulnerabilidade diante de algo tão grande e silencioso, sou uma intrusa me debatendo na água salgada quebrado a harmonia do mar e seu contínuo canto de sons graves com o meu debater agudo. Com esse simples vacilo o mar notou minha presença, me preencheu, me sugou,  tirou meu fôlego com seu beijo. Comecei assim a ter pavor do mar.

         Teimosa decidi fazer aulas de natação e para minha surpresa tenho ido muito bem. O medo era uma bobagem e hoje eu é quem exerço o controle sobre a água.  
        Faço aulas  toda semana me esquecendo assim de traumas que agora se escondem cada vez mais no fundo da piscina do clube.

        Certa vez ao chegar mais cedo na aula me deparo com a piscina sem ninguém dentro. A piscina me olhou como o mar e senti  um frio na barriga. Mesmo assim decido mergulhar.  Estou só e não resisto a chance de aproveitar a água só pra mim,  parece algo natural buscar a individualidade no prazer,  talvez por me sentir exclusiva e especial,  isso mexe muito com minha vaidade.
       Decido pular e nem percebo que fui muito fundo.  Conheço esse sentimento de querer subir logo,  poder respirar o quanto antes,  e uso toda minha energia com esse objetivo. Consigo alcançar a superfície e estou exausta. Não sei quanto tempo levei para subir, parece que levou dias. 
       Meu medo se tornou prazer, me sinto segura por saber nadar, e o prazer se torna pânico quando percebo que estou afundando novamente. 
     Começo a me debater, estou desesperada pois já não tenho força e estou me afogando.  
     Tornei-me novamente a menina apavorada. A maldita piscina esperou eu ter coragem e confiança para então assim me matar. Tão tranquilas suas águas que de ti não esperava tal traição.
        Ao me debater, meus braços e pernas se cansam ainda mais e nem percebo que estou indo em direção ao fundo cada vez mais rápido.Tudo vai ficando escuro.

         De repente tudo está calmo.  
       Estou me formando na faculdade, quantos momentos de muita dificuldade não passei para receber esse diploma? 
       Torno-me uma profissional bem sucedida.  Conheço o homem da minha vida e com ele tenho dois filhos.  Comemos juntos, viajamos juntos,  sorrimos juntos.
       Eu me tornei feliz e simples. Completa e realizada. 

          Mais o tempo passa. Agora estou velhinha, e estou na praia. Ao meu lado meu companheiro igualmente velho.  Arrumando a mesa para o almoço meu filho já homem,  já pai. 
Eu levanto-me de minha cadeira,  beijo meu amado e me dirijo ao mar.  Meu marido dorme tranquilamente e meu filho concentrado em deixar tudo perfeito para nossa refeição nem nota quando me levanto. 
          Entro no mar e antes do almoço ele me devora. Ninguém grita por mim e desapareço na imensidão azul. Posso ouvir o som do mar bem alto e talvez alguém está chamando por meu nome ao longe. Não sou capaz de afirmar, o chamado do mar é mais intenso.
          
          Morri solitária em uma piscina de clube mas foi o mar quem veio me buscar.

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